Dez respostas sobre a oração
O que é a oração?
Pode constatar-se como a oração é um “acontecimento” em que o Céu e a Terra se encontram: o Outro e a pessoa na sua unicidade parecem encontrar-se, pois está na natureza de Deus ser para a sua criatura, e esta, por graça – mas não só – encontrar-se nele. Definir a oração comporta mergulhar no horizonte do encontro entre a criatura capaz do infinito e o desejo de Deus de fazer-se conhecer. A dimensão ética também faz parte deste encontro.
Em que difere a oração cristã das outras formas de oração nas outras religiões?
A oração cristã é a oração de Cristo. A sua oração é de louvor, bênção, intercessão, invocação dirigida ao Pai. Toda a Igreja, cada crente singular em Cristo, entra na melodia de Cristo, move-se na consonância da oração de Cristo. A oração cristã é precisamente a oração do Espírito de Cristo. É Ele que nos faz gritar «Abbà, Pai», que nos alimenta os desejos a fim de que se tornem desejos de Deus, sede de comunhão com Deus. Podemos dizer que a oração cristã é especificamente a invocação do Espírito: dirigimo-nos ao Pai, através do Filho, no poder do Espírito Santo.
Quais são as dinâmicas humanas presentes na oração cristã?
A oração é um acontecimento que envolve a nossa humanidade: os pensamentos, os afetos, os sentimentos, a vontade, a perceção, o corpo. Em síntese, tudo de nós. Graças aos estudos de neurofisiologia, pode afirmar-se que a oração é uma atividade que move as estruturas cerebrais de maneira específica. Trata-se de um acontecimento fisiológico que não tem em conta a religião de pertença: todas as pessoas que entram na atividade orante, meditativa, reflexiva, e se colocam em relação com um “outro” transcendente, ativam partes do cérebro e do sistema nervoso que são comuns. A nossa estrutura humana é solicitada por uma opção relacional, ainda que se trate de um Outro não visível.
Como se insere a oração nas estruturas psicológicas da interioridade humana?
A oração envolve o sistema do pensamento que definimos como simbólico, evidenciando como este é específico da pessoa, e não dos animais não humanos. A oração é, portanto, um facto cultural que se alimenta de imagens, palavras, ações próprias de um grupo religioso. Através desta bagagem individual ou de grupo ativam-se formas simbólicas que entram na estrutura da oração.
Qual é o significado teológico específico da oração cristã?
A oração é uma palavra que entra, constrói, faz, realiza a relação entre o eu humano e o Eu divino. O seu contexto que definimos como “natural” é o dialógico, em que o Tu divino chama ou convoca o humano e condu-lo à relação. Se a relação eu-tu é a estrutura constitutiva da oração, a cristã funda esta relação na revelação. A Deus vai-se com Deus, com o Filho, no qual somos todos filhos e nos faz conhecer o Pai, ou seja, em sentido do evangelista João, faz-nos entrar na possibilidade de amar. Este é o agir do Espírito.
Quais são as linhas fundadoras da oração cristã?
Na sua reflexão sobre o Pai-nosso, Simone Weil conclui desta maneira… fundante: «Pertencemos-lhe. Ele ama-nos, visto que se ama e nós lhe pertencemos. Mas é o Pai que está nos céus. Não em qualquer outro lugar. Se cremos ter um Pai neste mundo não é Ele, é um falso Deus. Não podemos dar um único passo na sua direção. Não se caminha verticalmente. Não podemos dirigir para ele senão o nosso olhar».
A maneira como rezamos mudou ao longo dos séculos?
A oração na história é um tema muito complexo. Em poucas palavras, poder-se-ia dizer que estão presentes constantemente as duas formas principais da oração ligadas a duas dimensões da religiosidade. Há uma oração que exprime a forma funcional da religiosidade: é a que mostra submissão, magia, dependência para uma divindade na qual se acredita como sendo poderosa e ameaçadora. A isto pode associar-se o sacrifício, inclusive cruento, à oferta dos bens ou das coisas a esta divindade que não se conhece ou é percecionada como causa de temor ou de medo. Estas formas estão presentes ainda hoje em certas religiões, mas também na cristã, quando está presente uma deformação da ideia de Deus imaginado como todo-poderoso desconhecido. Assim pode ser também na devoção pessoal.
Diferente é a oração ao Deus conhecido…
A oração que exprime uma religiosidade ligada a um Deus conhecido, de quem se partilha a paixão pelo bem da humanidade, é feita de louvor, de agradecimento, de confiança, de intercessão confiante, e não de medo. Para nós, cristãos, é a oração de Jesus que ergue o seu canto de louvor e de glória ao Pai, e conduz os seus discípulos a entrar em relação com Deus na forma de filhos e filhas. As formas diferentes de oração podem ser descritas como presentes no percurso de amadurecimento da fé, da consciência crente. Assim, podemos discernir que figuras de Deus estão mais presentes no imaginário religioso individual. Em todo o caso, para um cristão, o “trabalho sobre as imagens de Deus” é sempre uma evangelização do nome de Deus e da sua representação.
Pode falar-se de uma pedagogia da oração?
Dissemos que encontramos na pessoa uma disposição natural para a transcendência. Cada religião, de todas as culturas, é expressão desta dinâmica presente. Por isso, os pertencentes a qualquer religião são iniciados à oração como principal expressão da relação com Deus: a oração materna, o exemplo de uma comunidade orante, a liturgia, as intercessões, e todas as formas relativas a esta disposição. Além disso, cada fase da vida prevê uma forma específica, adaptada e conformada às capacidades e disposições pessoais: uma criança reza como uma criança, um adulto reza como um adulto.
Como se aprende a rezar?
De um ponto de vista pedagógico não nos podemos deter apenas na dimensão evolutiva da pessoa. Com efeito, a relação com Deus alimenta-se de uma dimensão afetiva e cognitiva que se manifesta como uma forma de regressão boa, positiva, que valoriza a espera, a passividade, a escuta, a confiança, a disponibilidade. Tudo isto pertence aos conteúdos de um percurso pedagógico que educa a disponibilidade natural presente.
In SNPC – Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
Texto de Paola Zampieri sobre entrevista a Marzia Ceschia, professora de Teologia Espiritual, e Antonio Bertazzo, professor de Psicologia Geral e da Religião
In Settimana News
Tradução.: Rui Jorge Martins
Publicado em 12.07.2021