Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06 julho 2025
A missão dos 72 discípulos
Viver a Palavra
O Povo que regressa do exílio da Babilónia recebe, pela boca do profeta, a anúncio da paz, da salvação e da justiça que se manifestará numa Sião apresentada como mãe, pois Jerusalém se tornará um lugar de consolação e júbilo. Contudo, este feliz anúncio confiado ao Povo de Israel deve ecoar em todos os lugares e deve chegar a todos os corações, por isso, na plenitude dos tempos, na revelação operada por Jesus Cristo, Ele envia setenta e dois discípulos como mensageiros da paz e da alegria.
O envio dos setenta e dois discípulos é um exclusivo do Evangelho de S. Lucas e sublinha a qualidade missionária deste Evangelho, que faz missionários não apenas os Doze, mas todos os discípulos de Jesus. O número setenta e dois representa a totalidade das nações da terra, pois na tradição hebraica era este o número das nações que ocupavam a superfície da Terra. Deste modo, a missão confiada por Jesus, que deve chegar a todos os povos e nações, envolve todos os homens e mulheres e constitui cada batizado como um discípulo missionário.
Além disso, a imensa seara que somos chamados a evangelizar será sempre maior do que os trabalhadores disponíveis para a missão, contudo, esta consciência não pode ser lugar de desânimo, mas a certeza de que a nossa fragilidade e debilidade quando colocadas ao serviço do Evangelho realizarão muito mais do que aquilo que as nossas forças humanas, por si próprias, seriam capazes de realizar.
Os discípulos não partem sozinhos, mas são enviados dois a dois porque a sua comunhão e fraternidade são já anúncio do Reino. Juntos testemunham que a alegria da comunhão e a riqueza da fraternidade são a marca distintiva do Evangelho que os seus lábios anunciam.
Jesus envia-os «como cordeiros para o meio de lobos». O cordeiro é um animal dócil e pacífico e é precisamente nesta atitude que Jesus os envia, para que a mansidão e a ternura sejam o mais belo sinal da novidade do Evangelho que eles vão anunciar. Além disso, na riqueza semântica do aramaico talya’ significa cordeiro, mas também servo, pão e filho. Nestas quatro palavras encontramos um belíssimo programa de vida para a nossa missão ao serviço da Igreja e do Mundo. Ser cordeiro manso e dócil que coloca o Seu olhar em Jesus, o Bom Pastor, reconhecendo-O como único Senhor da sua vida. Ser servo, reconhecendo que a nossa missão se constitui como serviço humilde para que no mundo possa despontar a alegria do Evangelho. Ser pão, ao jeito de Jesus que se fez pão partido e repartido para a salvação de todos. Ser filho, testemunhando a alegria de invocar a Deus como nosso Pai, inaugurando no tempo e na história uma nova fraternidade.
Deste modo, mais do que uma doutrina ou um discurso a proclamar, Jesus confia aos Seus discípulos um novo estilo de vida que será anunciador da novidade do Reino. Jesus não envia missionários a levar alimentos, roupa e dinheiro aos necessitados, mas envia homens sem dinheiro, sem provisão de alimentos e despojados. A única coisa que devem levar é o anúncio da proximidade do Reino e a urgência da conversão.
«Ide: Eu vos envio». Hoje, estas palavras são dirigidas a cada um de nós. Batizados em Cristo, ungidos pela força do Espírito Santo e alimentados pelo Pão da Eucaristia somos enviados como discípulos missionários para comunicar a alegria do encontro com Jesus Cristo: «aquilo que descobriste, o que te ajuda a viver e te dá esperança, isso é o que deves comunicar aos outros» (EG 121). in Voz Portucalense
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Na nossa diocese, o segundo Domingo de Julho (o próximo) é dia de ordenações e, por isso, dia de celebrar a graça do ministério ordenado que o Senhor oferece à Sua Igreja como lugar de serviço aos irmãos. Deste modo, o Domingo XIV do Tempo Comum, que antecede o Domingo das ordenações, constitui-se como uma oportunidade para rezar por aqueles que serão ordenados no dia 13 de julho e desafiar os fiéis a ter esta intenção na sua oração ao longo desta semana. Acolhendo o pedido de Jesus no Evangelho deste Domingo – «pedi ao dono da seara que mande trabalhadores para a sua seara» – cada comunidade paroquial poderá organizar ao longo desta semana um momento comunitário de oração pelas vocações e de modo particular por aqueles que serão ordenados para o serviço da nossa diocese. in Voz Portucalense
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Já no Tempo Comum, continuamos o Ano Litúrgico – Ano C – onde seremos acompanhados pelo evangelista Lucas. Tendo em vista a formação bíblica dos fiéis e a importância do conhecimento da Sagrada Escritura como Palavra que ilumina a vida dos batizados, o contexto do início do Ano Litúrgico pode ser uma oportunidade para um encontro ou até vários encontros, sobre o Evangelista deste ano litúrgico.
Como se diz acima, durante todo este ano litúrgico – 2024/2025 -, acompanhamos o evangelista Lucas em grande parte das proclamações do Evangelho. Deste modo, como preparação complementar, poderá ser oportuna uma proposta de formação para todos os fiéis acerca do Evangelho de S. Lucas.
E faremos isso….
Em anexo à Liturgia da Palavra e, também, num separador próprio, da página da paróquia de Vilar de Andorinho, ficará disponível um texto sobre o evangelista Lucas. Poderão melhorar os conhecimentos bíblicos – Novo Testamento e Antigo Testamento – em https://paroquiavilarandorinho.pt/fbiblica/.Proporciona-se a todos os fiéis, um maior conhecimento deste precioso tesouro que é a Sagrada Escritura.
LEITURA I – Isaías 66,10-14c
Alegrai-vos com Jerusalém,
exultai com ela, todos vós que a amais.
Com ela enchei-vos de júbilo,
todos vós que participastes no seu luto.
Assim podereis beber e saciar-vos
com o leite das suas consolações,
podereis deliciar-vos no seio da sua magnificência.
Porque assim fala o Senhor:
«Farei correr para Jerusalém a paz como um rio
e a riqueza das nações como torrente transbordante.
Os seus meninos de peito serão levados ao colo
e acariciados sobre os joelhos.
Como a mãe que anima o seu filho,
também Eu vos confortarei:
em Jerusalém sereis consolados.
Quando o virdes, alegrar-se-á o vosso coração
e, como a verdura, retomarão vigor os vossos membros.
A mão do Senhor manifestar-se-á aos seus servos.
CONTEXTO
Nos capítulos 56 a 66 do livro de Isaías (o “Trito-Isaías”) temos uma coleção de textos, provavelmente de autores diversos, redigidos em Jerusalém na época pós-exílica. O poema que a liturgia deste segundo domingo comum nos apresenta como primeira leitura pertence a essa coleção.
Para aqueles que retornaram do Exílio na Babilónia, são tempos difíceis e incertos. A população da cidade é pouco numerosa e pobre; a reconstrução é lenta, modesta e exige um grande esforço; os inimigos estão à espreita e fazem continuamente sentir a sua hostilidade; há tensões no ar entre os que regressaram da Babilónia e aqueles que ficaram na cidade. Aos poucos, com a reorganização da estrutura social, voltam as injustiças dos poderosos sobre os fracos e os pobres, bem como a corrupção, a venalidade e a prepotência dos chefes. O clima é de frustração e de desânimo. As promessas de Deus, escutadas na fase final do Exílio, parecem bem distantes.
Os profetas que desenvolvem a sua missão nesta fase procuram renovar a esperança do Povo de Judá num futuro de vida plena e de salvação definitiva. Nesse sentido, vão falar de uma época em que Deus vai voltar a residir em Jerusalém, oferecendo em cada dia ao seu Povo a vida e a salvação. Essa “salvação” implicará, não só a reconstrução de Jerusalém e a restauração das glórias passadas, mas também a libertação dos pobres, dos oprimidos, dos fracos, dos marginalizados.
É neste ambiente que podemos situar o belíssimo poema de Is 66,7-14, do qual o nosso texto faz parte. O profeta pronuncia palavras de consolação e convida os habitantes de Jerusalém a alegrarem-se, pois vai chegar, por iniciativa de Deus, um tempo novo.in Dehonianos
INTERPELAÇÕES
- As palavras de consolação que Deus, neste texto, dirige aos filhos de Jerusalém chegam aos destinatários pela voz de um profeta cujo nome ignoramos, mas que foi um sinal vivo de Deus no meio do seu povo. Esta forma que Deus tem de chegar ao coração dos seus filhos repete-se infinitamente na história dos homens: é através dos seus profetas que Ele enxuga as lágrimas, consola os corações feridos, sacia os famintos, liberta do medo, salva da morte, mostra a sua solicitude e o seu amor. Hoje, neste tempo de tantos desencantos e de tantos desconcertos, são muitos os filhos de Deus que caminham na escuridão e se julgam abandonados por Deus e pelos homens. Eles necessitam de escutar a Boa notícia da salvação e de experimentar o amor materno e paterno de Deus. Poderá Deus contar connosco para sermos profetas do seu amor junto dos nossos irmãos? Estamos disponíveis para testemunhar, com palavras e com gestos concretos, a grandeza do amor de Deus por todos os seus filhos?
- Como é que vemos Deus? Que imagem fazemos d’Ele? Há muitos homens e mulheres que veem Deus como uma entidade distante, misteriosa, severa, da qual temos de nos aproximar com infinitos cuidados, fazendo tudo para evitar desrespeitar a sua grandeza e omnipotência… No entanto, na primeira leitura que a liturgia deste domingo nos oferece, Deus apresenta-se como uma mãe que ama enternecidamente os seus filhos, que pega neles ao colo, que os acaricia sobre os joelhos, que os anima e conforta. Ora, um amor assim não tem nada de distante, de severo, de austero, de castigador, de exigente… É um amor inquebrantável, infinito, que se expressa em ternura e carinho, como o amor de mãe; é um amor que põe acima de tudo a vida e a felicidade dos seus filhos. É nesse Deus que acreditamos? É esse Deus que nós anunciamos e testemunhamos aos irmãos que se cruzam connosco nos caminhos que todos os dias percorremos?
- Deus, pela boca do profeta, convida os “filhos de Jerusalém” à alegria. Quem é amado como eles, não pode deixar-se abater pela tristeza, pela angústia e pelo medo. O amor de Deus pelos seus filhos é infinitamente mais forte do que a maldade, a mentira, o sofrimento, as desgraças que nos atingem em alguns passos mais escuros do caminho que percorremos. Nós, filhos queridos e amados de Deus, vivemos iluminados pela alegria, ou acabrunhados sob o peso da angústia? Testemunhamos alegria e esperança no meio dos nossos irmãos? in Dehonianos.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 65 (66)
Refrão: A terra inteira aclame o Senhor.
Aclamai a Deus, terra inteira,
cantai a glória do seu nome,
celebrai os seus louvores, dizei a Deus:
«Maravilhosas são as vossas obras».
A terra inteira Vos adore e celebre,
entoe hinos ao vosso nome.
Vinde contemplar as obras de Deus,
admirável na sua acção pelos homens.
Mudou o mar em terra firme,
atravessaram o rio a pé enxuto.
Alegremo-nos n’Ele:
domina eternamente com o seu poder.
Todos os que temeis a Deus, vinde e ouvi,
vou narrar-vos quanto Ele fez por mim.
Bendito seja Deus que não rejeitou a minha prece,
nem me retirou a sua misericórdia.
LEITURA II – Gálatas 6,14-18
Irmãos:
Longe de mim gloriar-me,
a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo,
pela qual o mundo está crucificado para mim
e eu para o mundo.
Pois nem a circuncisão nem a incircuncisão valem alguma coisa:
o que tem valor é a nova criatura.
Paz e misericórdia para quantos seguirem esta norma,
bem como para o Israel de Deus.
Doravante ninguém me importune,
porque eu trago no meu corpo os estigmas de Jesus.
Irmãos, a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo
esteja com o vosso espírito. Amen.
CONTEXTO
A Galácia era uma região da Anatólia central, na atual Turquia. A região tinha esse nome por causa dos imigrantes gauleses que, nos começos do séc. III a.C. aí se instalaram. Na época de Paulo, a Galácia era uma província do império romano.
De acordo com o livro dos Atos dos Apóstolos, Paulo cruzou mais do que uma vez as terras da Galácia. Na sua primeira viagem apostólica, Paulo e Barnabé evangelizaram o sul da província romana da Galácia: Pisídia, Licaónia, Frígia (cf. At 13,14-25). Foi, contudo, nas suas segunda e terceira viagem missionária que Paulo estabeleceu laços com as gentes do norte da Galácia (cf. At 16,6; 18,23), resultando daí o nascimento de diversas comunidades cristãs na região.
A Carta aos Gálatas dá a entender que o apóstolo, numa das suas passagens pela Galácia, se deteve algum tempo na região, afetado por um problema de saúde (cf. Gl 4,13). Acolhido pela generosa hospitalidade das gentes da região, Paulo anunciou-lhes o Evangelho. Do anúncio de Paulo nasceram diversas comunidades cristãs. No entanto, Paulo não teve então oportunidade de ficar entre os gálatas muito tempo, deixando-lhes uma preparação cristã insuficiente. Teria sido no decurso da sua terceira viagem missionária que Paulo escreveu aos gálatas, instruindo-os sobre diversas questões da fé. Estaríamos aí pelos anos 56-57, pouco antes da redação da Carta aos Romanos.
Paulo estava em Éfeso ou em Corinto quando soube que alguns pregadores cristãos tinham passado nas comunidades cristãs da Galácia e tinham insistido na necessidade de todos os cristãos se submeterem a diversas práticas da Lei de Moisés (cf. Gl 3,2; 4,21; 5,4), nomeadamente à circuncisão (cf. Gl 2,3-4; 5,2; 6,12). Paulo, apoiado nas decisões do “Concílio de Jerusalém” (cf. At 15,22-29), considerava que o cumprimento das tradições judaicas não era necessário para a adesão a Cristo. A Lei moisaica tinha sido superada pela novidade de Jesus. Para ser cristão bastava acreditar em Jesus e no seu Evangelho.
Foi essa a razão fundamental que levou Paulo a escrever a carta de Paulo aos gálatas. Nessa carta Paulo pedia os seus queridos filhos da Galácia que não se deixassem enganar pelos “judaizantes”; e exortava-os a não se deixarem cair na escravidão da Lei de Moisés.
O nosso texto integra a conclusão da carta (cf. Gl 6,11-18). É uma espécie de remate, no qual Paulo resume toda a sua argumentação anterior a propósito de Cristo, da Lei e da salvação. in Dehonianos.
INTERPELAÇÕES
- Paulo de Tarso, apaixonado por Cristo, apostou toda a sua vida em dar testemunho do Evangelho. Viveu a missão com radicalidade, numa entrega total. Enfrentou todas as oposições e todas as incompreensões, pois Cristo tornou-se, para ele, “o tesouro mais valioso”, pelo qual vale a pena renunciar a tudo o resto. Nós estamos habituados a ver Paulo como um caso excecional, ímpar, irrepetível; sentimos que uma aposta tão radical e tão completa em Cristo não é exatamente para nós… É verdade que cada cristão terá a sua forma própria de concretizar o seguimento de Jesus; mas, sejam quais forem as “paisagens” e os enquadramentos onde a nossa vida se concretiza, somos chamados a testemunhar o Evangelho de Jesus e a dizer aos homens que só do dom da vida, do amor até ao extremo, nasce o Homem Novo. Sentimos que é esse o nosso caminho, a nossa vocação fundamental? Como Paulo, estamos dispostos a enfrentar a incompreensão do mundo, a fim de que a proposta de Jesus chegue ao coração e à vida dos nossos contemporâneos?
- Paulo refere, na carta aos gálatas, o caso de pregadores cristãos (os “judaizantes”) que se gabavam da sua fidelidade às tradições judaicas e à Lei de Moisés. Consideravam que, entre outras coisas, a circuncisão era a marca da sua pertença ao povo de Deus. Contavam ser apreciados e elogiados por esses sinais externos que, segundo eles, mostrava a fé que os animava. Diante disto, Paulo declara que a única coisa de que se gloria é a cruz de Cristo. Só lhe interessa ser arauto daquele homem que, morrendo na cruz, ensinou os seus discípulos a fazerem das suas vidas um dom de amor. Este quadro pode constituir um convite a que reflitamos sobre aquilo que constitui a essência da nossa experiência de fé, da nossa identidade enquanto cristãos. O discípulo de Cristo é alguém que se distingue pela roupa que veste, pela cruz que traz ao pescoço, pelo papel que alguém assinou por ele no dia do batismo, pelos rituais que cumpre, pela observância de determinadas leis canónicas, ou é alguém que se distingue pela sua identificação com Cristo – com o Cristo do amor, da entrega, do dom da vida?
- A propósito da reflexão feita por Paulo sobre os “títulos de glória” que devem interessar a um discípulo de Jesus, podemos questionar-nos sobre os valores sobre os quais construímos o nosso projeto de vida. Os influenciadores e os líderes da opinião pública dizem-nos todos os dias a que valores devemos agarrar-nos para ter êxito, para ser socialmente considerado, para triunfar… Sabemos, no entanto, que em muitos casos esses valores estão em flagrante contradição com o Evangelho de Jesus. Quais são os “títulos de glória” a que damos apreço? Quais os valores sobre os quais alicerçamos a construção da nossa vida? in Dehonianos
EVANGELHO – Lucas 10,1-12.17-20
Naquele tempo,
designou o Senhor setenta e dois discípulos
e enviou-os dois a dois à sua frente,
a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir.
E dizia-lhes:
«A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos.
Pedi ao dono da seara
que mande trabalhadores para a sua seara.
Ide: Eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos.
Não leveis bolsa nem alforge nem sandálias,
nem vos demoreis a saudar alguém pelo caminho.
Quando entrardes nalguma casa,
dizei primeiro: ‘Paz a esta casa’.
E se lá houver gente de paz,
a vossa paz repousará sobre eles:
senão, ficará convosco.
Ficai nessa casa, comei e bebei do que tiverem,
que o trabalhador merece o seu salário.
Não andeis de casa em casa.
Quando entrardes nalguma cidade e vos receberem,
comei do que vos servirem,
curai os enfermos que nela houver
e dizei-lhes: ‘Está perto de vós o reino de Deus’.
Mas quando entrardes nalguma cidade e não vos receberem,
saí à praça pública e dizei:
‘Até o pó da vossa cidade que se pegou aos nossos pés
sacudimos para vós.
No entanto, ficai sabendo:
Está perto o reino de Deus’.
Eu vos digo:
Haverá mais tolerância, naquele dia, para Sodoma
do que para essa cidade».
Os setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo:
«Senhor, até os demónios nos obedeciam em teu nome».
Jesus respondeu-lhes:
«Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago.
Dei-vos o poder de pisar serpentes e escorpiões
e dominar toda a força do inimigo;
nada poderá causar-vos dano.
Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos obedecem;
alegrai-vos antes
porque os vossos nomes estão escritos nos Céus».
CONTEXTO
O Evangelho deste domingo situa-nos no cenário da caminhada de Jesus para Jerusalém. No entanto, não se identifica o lugar exato onde a cena descrita se terá desenrolado.
Durante algum tempo, Jesus tinha anunciado o Reino de Deus pelas aldeias e vilas da Galileia. Essa etapa estava concluída. Para que o projeto de Deus se concretizasse, era preciso dar o passo seguinte. Ora, esse passo seria ir a Jerusalém, confrontar as autoridades religiosas judaicas e desafiá-las a acolher o Reino de Deus. De acordo com as tradições judaicas, era em Jerusalém que o Messias se iria manifestar a Israel e apresentar ao povo de Deus a sua proposta libertadora. Jerusalém era, portanto, o “lugar” onde a salvação de Deus iria irromper na história dos homens. Aliás, na segunda parte da sua obra (os “Atos dos Apóstolos”), Lucas irá contar como essa salvação, levada pelos discípulos, alcançará todas as nações e de todos os povos.
Portanto Jesus, rodeado pelos discípulos, pôs-se a caminho de Jerusalém. O caminho para Jerusalém, tão importante no projeto teológico de Lucas (cf. Lc 9,51-19,28), mais do que um caminho geográfico, é um caminho espiritual e teológico. Ao longo desse caminho, Jesus vai confrontando os discípulos com a lógica do Reino de Deus e desafiando-os a aderir plenamente a esse projeto. À medida que caminham, os discípulos vão crescendo na fé e consolidando a sua adesão a Jesus. Aprendem a despir-se dos seus projetos pessoais e dos seus sonhos de grandeza humana, a fim de abraçar os valores do Reino. A caminhada para Jerusalém foi a “escola” que preparou os discípulos para serem, após a morte e ressurreição de Jesus, as testemunhas do Reino de Deus em toda a terra.
A história do envio dos setenta e dois discípulos em missão, referida neste contexto da caminhada para Jerusalém, é uma tradição exclusiva de Lucas. Seria uma história estranha e inesperada, se a víssemos como um relato factual de acontecimentos: de onde vêm estes setenta e dois discípulos, que não são nomeados nem por Mateus nem por Marcos e que aqui aparecem de repente, surgidos do nada? O mais provável é que devamos entender este texto como uma catequese. Lucas teria representado, neste grupo, os discípulos de todas as épocas, que caminham com Jesus e que Jesus envia ao mundo a anunciar o Evangelho. in Dehonianos
INTERPELAÇÕES
- Lucas procura dizer-nos, na “catequese” que nos deixa no Evangelho deste dia, que a Igreja nascida de Jesus é, na sua essência, uma Igreja missionária, uma Igreja “em saída”. Aqueles que caminham com Jesus são enviados “a todas as cidades e lugares aonde Ele havia de ir”, para anunciar e propor a salvação de Deus. Se olharmos à nossa volta poderemos constatar como esse anúncio é necessário e urgente. Muitos dos homens e mulheres com quem nos cruzamos todos os dias sentem-se amarrados a vidas sem sentido e sem esperança; navegam à vista, sem conseguirem ver para além das banais preocupações do dia a dia; os valores sobre os quais constroem a sua existência são valores efémeros, que não conseguem saciar a fome de eternidade que existe no coração de cada pessoa. Necessitam de escutar a Boa Nova da salvação, de acolher no coração a paz de Deus, de serem curados dos ferimentos dolorosos que as injustiças, as maldades, as violências de todos os tipos lhes gravaram na alma. Estamos conscientes de que o nosso nome consta daquela lista de “setenta e dois discípulos” que Jesus envia “a todas as cidades e lugares” onde a Boa Notícia da salvação deve chegar? Inquieta-nos a escravidão em que tantos dos nossos irmãos vivem, ou limitamo-nos a seguir Jesus à distância, comodamente instalados numa prática religiosa ritualista, indolor e descomprometida?
- Os enviados de Jesus não vão individualmente, cada um por si, mas vão dois a dois. O testemunho da Boa Nova da salvação tem uma dimensão comunitária. O enviado não parte por iniciativa pessoal, a fim de transmitir opiniões pessoais ou doutrinas próprias; não atua de acordo com as regras que ele próprio define, à revelia da comunidade ou contra a comunidade; ao dar testemunho, não dirige o foco para si próprio, nem se coloca sob as luzes da ribalta para que todos o vejam e admirem… O “missionário” de Jesus deve estar em comunhão com a Igreja, dar testemunho da fé da Igreja e fazer com que os destinatários do anúncio se liguem a Jesus através da Igreja. Como é o testemunho que damos? Anunciamos a fé que recebemos da comunidade e que vivemos em comunidade, ou impingimos aos outros as nossas teorias e visões pessoais? No centro do nosso testemunho está Jesus e o seu Evangelho, ou está a nossa pessoa?
- Jesus pede aos seus enviados que, quando partem em missão, não levem “bolsa, nem alforge, nem sandálias”. Talvez o pedido de Jesus nos pareça excessivo; mas, por detrás deste excesso, está uma realidade incontornável: há coisas que arrastamos continuamente atrás de nós e que nos impedem de dar atenção ao essencial. Jesus quer ver os seus discípulos livres, sem “bagagem” que os distraia e atrase, apenas preocupados com o anúncio do Reino de Deus. Também quer que os seus discípulos não coloquem a sua esperança nas seguranças humanas, nas tecnologias de última geração, nas estratégias de marketing, na proteção dos poderosos, nos jogos de influência… Fundamentalmente, o discípulo de Jesus confia em Deus, na sua bondade, no seu amor de Pai; confia na força renovadora e transformadora do Evangelho, que é uma pequena semente lançada à terra mas que produz um fruto abundante. Como nos situamos face a isto? Chamados a dar testemunho da salvação de Deus diante dos nossos irmãos, em que realidades colocamos a nossa confiança e a nossa esperança?
- “Eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos” – diz Jesus aos seus enviados. Os discípulos, “armados” apenas com a força do Evangelho, terão frequentemente de enfrentar um mundo hostil, agressivo, que rejeitará a mensagem, que ridicularizará as propostas de que eles são arautos; e serão perseguidos, humilhados, maltratados, condenados pelas forças da injustiça, da maldade, da mentira, do pecado. Apesar disso, os discípulos de Jesus devem abordar o mundo com bondade, com mansidão, com paciência, com compreensão, com amor. A história já demonstrou muitas vezes que, sempre que os discípulos de Jesus utilizam os métodos dos “lobos” para lidar com o mundo, perdem toda a credibilidade e subvertem a lógica do Evangelho. Como é que nós, discípulos de Jesus, reagimos diante da incompreensão e da agressividade do mundo?
- O anúncio do “Reino” não se esgota em palavras, mas deve ser acompanhado de gestos concretos. “Quando entrardes nalguma cidade, curai os doentes que nela houver” – pede Jesus aos discípulos. “Curar” é libertar os homens e mulheres que são prisioneiros da injustiça, da prepotência dos grandes, da exploração dos poderosos; “curar” é limpar, através do amor, as feridas que deixaram marcas no corpo e no espírito dos sofredores; “curar” é acolher aqueles que são desprezados, ignorados e abandonados pela sociedade e pelas igrejas; “curar” é tratar como irmãos os “diferentes”, os desadaptados, os que assumem atitudes ou comportamentos pouco ortodoxos; “curar” é cuidar de cada homem ou cada mulher que encontrarmos caído na berma da estrada da vida. Sentimo-nos enviados de Jesus a “curar” as feridas dos irmãos e das irmãs com quem nos cruzamos todos os dias?
- Jesus garante aos seus enviados que o testemunho que eles vão dar terá resultados extraordinários: “Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago. Dei-vos o poder de pisar serpentes e escorpiões e dominar toda a força do inimigo; nada poderá causar-vos dano”. Talvez concluamos, a partir destas palavras, que o caminho que os discípulos são chamados a percorrer será fácil cómodo, indolor, sem crises nem obstáculos. Na realidade, será sempre um caminho difícil, duro, exigente, muitas vezes percorrido no meio de lágrimas, de incompreensões e de perseguições. As palavras de Jesus referem-se, sobretudo ao resultado final: apesar da presença do mal na história e na vida dos homens e do mundo, a vitória será de Deus e dos seus mensageiros. O mal irá “cair”, irá perder o seu poder. Do anúncio do Evangelho nascerá um mundo novo, um mundo desenhado de acordo como o projeto de Deus. Acreditamos nisso? Essa certeza alimenta a nossa vida e a nossa luta? Somos testemunhas desta esperança junto dos nossos irmãos desiludidos e desanimados? in Dehonianos.
Para os leitores:
A primeira leitura é um convite à alegria e ao júbilo, por isso, a proclamação deste texto deve ser marcada pelo tom alegre e gaudioso de que o Senhor salvará o Seu povo e manifestará as Suas maravilhas.
A segunda leitura não apresenta nenhuma dificuldade aparente na sua proclamação, mas requer uma acurada preparação para que toda a expressividade do texto esteja presente na sua leitura.
I Leitura: (ver anexo)
II Leitura: (ver anexo)
ANEXOS:
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- Leitura I do Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06.07.2025 (Isaias 66, 10-14c)
- Leitura II do Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06.07.2025 (Gálatas 5, 1.13-18)
- Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06.07.2025 – Lecionário
- Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06.07.2025 – Oração Universal
- Domingo XIV do Tempo Comum – Ano C – 06.07.2025 – refletindo
- ANO C – Ano de Lucas- 2024-2025