Conversando … com o Pároco – Mês VIII – maio 2025
O Papa Francisco partiu para o Pai na 2ª feira da Páscoa da Ressurreição. Fez também a sua Páscoa (passagem)
Agora o Pastor usa o nome de Leão XIV e é, também, proveniente das Américas (do Norte por nascimento do Sul por missão).
Partilhe connosco o legado de Francisco e o projeto/programa/pastoreio previsível de Leão XIV
Quando a Igreja preparava a eleição do Papa Francisco, em Março de 2013, eu preparava a celebração das minhas BODAS DE PRATA SACERDOTAIS. De facto, fui ordenado sacerdote no dia 9 de Abril de 1988 e um grupo de paroquianos ultimava a edição de um livro para marcar essa data. Um dos capítulos do livro é uma entrevista que me é feita e onde me questionam acerca das minhas “expectativas sobre o próximo Papa”, em vias de ser escolhido.
Na minha resposta, começo por dizer que gostaria muito que ele escolhesse o nome Francisco. Que trouxesse a vontade e o esforço para “reconstruir a Igreja”.
Giorgio Bergoglio foi eleito Papa, escolheu o nome Francisco e deixou-nos o legado de um Papa mais profético do que governante. Ele deslocou o centro da atenção da Igreja — de Roma para as periferias —, tentou suavizar a rigidez disciplinar e dar à Igreja uma voz mais relevante nas grandes questões sociais e ambientais. Mas também gerou divisões internas e não promoveu mudanças estruturais tão profundas quanto muitos esperavam.
O legado do Papa Francisco pode ser percebido em dois âmbitos principais: para a Igreja e para o Mundo.
- Para a Igreja Católica
Francisco tentou descentralizar o poder da Cúria e promover uma gestão mais sinodal. A Constituição Apostólica Praedicate Evangelium (2022) reorganizou os dicastérios e enfatizou o serviço, mas mudanças estruturais mais profundas enfrentaram forte resistência interna.
Criticou duramente o clericalismo como um dos grandes pecados da Igreja. Incentivou o papel dos leigos, mas sem alterar profundamente a estrutura hierárquica.
Tentou tornar o Vaticano mais transparente financeiramente. Houve acções corajosas, como julgamentos de figuras importantes (o Cardeal Becciu), mas a corrupção não foi erradicada.
O seu estilo pastoral também merece referência:
Quebrou protocolos, aproximando-se dos pobres, migrantes, presos e marginalizados. O seu lema episcopal, “miserando atque eligendo”, traduz-se num pontificado marcado pela misericórdia.
A sua linguagem é acessível, popular, às vezes doutrinalmente ambígua, agradou a muitos e irritou outros tantos….
Francisco deixou também uma grande marca nas questões morais e disciplinares:
Com Amoris Laetitia (2016), abriu espaço para que, em certos casos, os divorciados recasados recebam os sacramentos. Esta sua posição gerou desagrado entre os cristãos, inclusive entre bispos.
Desagrado que se verificou ainda quando adoptou uma atitude pastoralmente mais acolhedora em relação à comunidade LGBT – “Quem sou eu para julgar?“-, embora, neste caso não tenha também conseguido mudar a doutrina oficial.
Gerou grandes expectativas no que toca a ordenação de mulheres e o celibato opcional, mas ainda aqui não avançou com mudanças concretas, apesar de o assunto ter sido recorrente em sínodos recentes.
Incentivou fortemente a Igreja a tornar-se mais participativa, mas os efeitos práticos permanecem tímidos e incertos e esbarram com demasiadas críticas internas.
- Para o mundo
Francisco revelou-se um grande defensor das causas dos pobres e dos migrantes, chamando a atenção constante para os refugiados, as periferias sociais e os descartados — o conceito do “mundo das periferias” é central no seu pensamento. Denunciou o sistema econômico global como “uma economia que mata” (Evangelii Gaudium). Criticou fortemente o neoliberalismo e a globalização excludente.
A sua encíclica Laudato Si’ (2015) é um marco no pensamento ecológico contemporâneo. Pela primeira vez, um Papa colocou a crise climática no centro do magistério. Fez da ecologia integral uma proposta ética que conecta pobreza, injustiça e degradação ambiental.
Promoveu Encontros históricos com líderes islâmicos, como o Grande Imã de Al-Azhar, marcando uma nova fase do diálogo inter-religioso.
Assinou o Documento sobre a Fraternidade Humana (Abu Dhabi, 2019), buscando uma ética global de convivência da promoção da Paz. Ao mesmo tempo, condenou com firmeza guerras, especialmente a da Ucrânia, embora a sua postura frente à Rússia tenha sido marcada por alguma ambiguidade…
Manteve uma Voz profética e conseguiu estabelecer Pontes inéditas.
Com a morte de Francisco, o Espírito Santo inspirou a escolha do Cardeal norte americano Robert Francis Prevost que escolheu o nome Leão XIV.
Leão XIV é descrito como um homem discreto e de voz tranquila que evita os palcos e os holofotes. Possui formação em matemática e teologia e um profundo conhecimento da lei canônica. Traz com ele uma longa experiência de serviço missionário no Peru.
Leão XIV carrega no seu pontificado o peso do legado de Francisco, o pastor que quis uma Igreja pobre, sinodal e misericordiosa; de Bento XVI, o teólogo que tentou salvar a fé com a razão, mas foi vencido pela complexidade da crise eclesial moderna; de João Paulo II, o Papa actor que combateu o comunismo, mobilizou multidões e consolidou a doutrina moral católica no fim do século XX.
O seu nome papal homenageia Leão XIII, conhecido por desenvolver o ensino social católico moderno durante a Segunda Revolução Industrial. Nessa linha, Leão XIV acredita que a actual Quarta Revolução Industrial, especialmente os avanços em inteligência artificial e robótica, representa “novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho”.
É ainda cedo, prematuro e arriscado prever qual e como será o seu projecto/programa de pastoreio da Igreja. Os seus primeiros gestos, contudo, indicam um compromisso alinhado com a abertura implementada por Francisco e com a continuidade das reformas por ele iniciadas, adaptando-as aos desafios contemporâneos. No seu primeiro discurso, de facto, ele expressou gratidão ao Papa Francisco, destacando a continuidade de uma Igreja voltada para a justiça social e o diálogo.
Ao mesmo tempo, enfatizou a necessidade de Paz efectiva e reconciliação sincera, pedindo o fim imediato dos conflitos na Ucrânia e na Faixa de Gaza, além de assistência humanitária às populações afectadas.
Durante a Missa de inauguração do seu pontificado, no dia 18 de Maio, Leão XIV convidou: “É a hora do amor! Olhem para Cristo e aproximem-se d´Ele” .
Com base nestes primeiros passos e na história pessoal que carrega, podemos antecipar que o pontificado de Leão XIV provavelmente se concentrará em promover:
- a Justiça social, continuando o legado de Francisco, com foco nos migrantes, nos pobres e marginalizados.
- a Paz e a reconciliação, actuando na mediação de conflitos e promoção da Paz mundial.
- os desafios tecnológicos, a partir de uma reflexão ética sobre os impactos da inteligência artificial e da robótica na dignidade humana e no trabalho.
- a Sinodalidade, tornando a Igreja cada vez mais participativa e descentralizada.
- a continuidade pastoral, mantendo a linguagem acessível e acolhedora de Francisco e buscando aproximar a Igreja de todas as pessoas (todos, todos, todos…), para ser cada vez mais uma Igreja em saída.
Que Deus abençoe o Papa Leão XIV e que a Igreja saiba ouvi-lo e acompanhá-lo nos seus bons propósitos.