Um grupo de leitores envia carta aos Bispos Portugueses

 

Em carta aos bispos portugueses

Grupo de leitores do 7MARGENS propõe prioridades para uma Igreja sinodal

7MARGENS | 06/06/2025

Exercendo o direito e dever que lhes assiste (LG,37) de dar conta aos seus bispos daquilo que os preocupa, um grupo de católicos de diversas dioceses do país acaba de lhes endereçar uma carta sobre aspetos que devem merecer atenção e prioridade na concretização de uma Igreja sinodal. Os subscritores são membros de um dos três grupos que surgiram dos encontros de leitores do 7MARGENS, realizados no outono de 2024, no Porto e em Lisboa e o que partilham emerge da reflexão feita em várias reuniões, em torno do Documento Final do Sínodo. Ao mesmo tempo têm em conta que as Jornadas Pastorais do episcopado, previstas para este mês (16-18 de junho) “serão também um momento de escuta e discernimento sobre a concretização das orientações sinodais nos organismos centrais da Igreja, procurando caminhar para uma transformação sinodal das suas estruturas”. É o seguinte o teor da carta:

Estimado Presidente e caros membros da Conferência Episcopal,

Em primeiro lugar, queremos apresentar a nossa saudação fraterna e pascal.

Somos um grupo diversificado de pessoas, oriundas de diferentes partes do país, umas mais e outras menos envolvidas na vida da Igreja, que partilham a fé em Jesus e no seu Evangelho.

Reunimo-nos regularmente, desde janeiro, motivados pela necessidade que sentimos de, enquanto leitores do jornal 7MARGENS, aprofundar o tema da Igreja Sinodal, a partir das nossas experiências de vida, bastante diversificadas, por sinal.

Nesse caminho, no seguimento da observação recente do bispo José Ornelas, de que “as mudanças não dependem só da hierarquia, mas de todos os fiéis”, sentimos necessidade de partilhar convosco algumas preocupações, admitindo que poderão ser relevantes e úteis enquanto contributo para as jornadas que a CEP promove em meados de junho próximo.

Acompanhando o percurso da nossa Igreja, especialmente desde que, em finais de outubro de 2024, foi publicado o Documento final da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, de imediato homologado pelo Papa Francisco, sentimos que, em Portugal, se tem avançado lentamente na etapa da implementação.

A iniciativa do encontro nacional de conselhos pastorais e de equipas sinodais foi, sem dúvida, louvável, mas o episcopado português que, tanto quanto sabemos, nunca se pronunciou publicamente sobre as sínteses nacionais de 2022 e 2024 solicitadas à equipa nacional que criou, só nestas jornadas de junho irá debruçar-se detidamente sobre o assunto. Não sentimos, aliás, um apelo estimulante por parte da hierarquia para que as comunidades católicas se envolvessem na leitura e discussão desse Documento Final. É essa a perceção que temos e, desde já, pedimos desculpa se laboramos em dados errados.

Sendo certo que as dioceses e as várias comunidades de batizados podem (e devem) tomar iniciativas – e algumas têm-nas tomado – ainda não há orientações nacionais que possam servir de apoio às dinâmicas locais ou setoriais. Tais orientações são necessárias, não tanto para indicarem o que é necessário fazer (afinal, todos somos Igreja), mas para ter presentes as áreas ou problemáticas do Documento final que são consideradas prioritárias, bem como os recursos e apoios com que podem vir a contar.

Porém, mais do que lamentar-nos, queremos ter presente o que percebemos como a realidade da situação presente e, a partir daí, enunciar, de entre os vários pontos possíveis, aqueles que, a partir dos nossos encontros, nos parecem prioritários. Nessa linha, propomos os seguintes:

  1. Aprender a escutar e a dialogar, tendo em vista uma participação efetiva de todos os católicos e outras pessoas de boa vontade independentemente da idade, género, condição social ou nacionalidade. Todos ouvimos, mas poucos aprendemos a escutar ativamente, acolhendo a palavra, a experiência e a pessoa do outro concreto, certamente diferente de nós, mas que, por isso mesmo, nos enriquece. A aprendizagem faz-se não tanto através de lições ou palestras, mas no experimentar, nas diferentes situações e níveis da vida eclesial, com verdadeira paridade de posições entre todos os participantes.
  2. Prestar atenção ao que se passa à nossa volta e a analisar e interpretar criticamente o mundo e a vida. Nessa linha, dar mais atenção a vida concreta das pessoas, em todas as dimensões, incluindo as realidades concretas das famílias, do mundo do trabalho, dos marginalizados e descartados, dos pobres. Procurar, aí, discernir a presença (ou ausência) de Jesus, bem como das situações e problemas que negam a dignidade das pessoas.

III. Ler, conhecer e meditar a Palavra de Deus, pessoalmente e em comunidade, para alimentar a vida interior e poder lançar um olhar evangélico sobre as pessoas e as situações que requerem o nosso cuidado.

  1. Ler, conhecer e meditar na Doutrina Social da Igreja, procurando a inspiração e o apoio para o testemunho do Evangelho.

Relativamente a ações a empreender, deixamos à consideração da Conferência Episcopal e de cada bispo os seguintes pontos:

  1. Desenvolver um trabalho de auscultação alargada e de sensibilizaçãodas comunidades cristãs aberto a todos os batizados e pessoas de boa vontade, com vista à progressiva implementação, ao longo dos próximos três anos, do espírito e da prática sinodal, nomeadamente através dos conselhos pastorais paroquiais e nos diferentes setores da vida das comunidades. Essa consulta não deve esquecer os temas que ficaram em aberto nos trabalhos do último Sínodo, alguns deles encaminhados para Grupos de trabalho no Vaticano. Pensamos, em particular, no lugar das mulheres na Igreja católica.
  2. Apostar em processos de formação de todos os membros da Igreja(leigas e leigos, religiosos, lideres setoriais, ministros ordenados…), que responda às necessidades sentidas pelas próprias comunidades e que tome as experiências e percursos do vivido como ponto de partida para o eventual diálogo com peritos.
  3. Ponderar a criação de uma rede de agentes de pastoralque, ao nível diocesano ou da província eclesiástica, possa dar apoio a comunidades que dele careçam.
  4. Definir um horizonte temporal para odesenvolvimento de reformas que promovam uma Igreja mais transparente e comunicativaquanto àquilo que faz, aos critérios de participação e prestação de contas por que se rege, quanto à gestão dos seus bens e recursos, à eleição e rotação dos cargos dirigentes, tendo por referência os pontos 99 e seguintes do Documento final do Sínodo sobre a Sinodalidade.
  5. Ponderar a realização regular de assembleias sinodaisdiocesanas e, mais espaçadamente, de uma assembleia sinodal nacional, que permita trocar experiências; apoiar os que caminham mais devagar; estabelecer redes de cooperação e ajudar a traçar horizontes quer para uma Igreja mais sinodal em Portugal, quer para uma sociedade mais participativa e fraterna.
  6. Repensar o funcionamento da Conferência Episcopal, abrindo mais algumas das suas reuniões a leigos e leigas e ministros ordenados ligados às matérias debatidas; transmitindo partes relevantes das suas reuniões que possam interessar os fiéis e dando a conhecer com mais anterioridade os assuntos que constituem a agenda das reuniões.

Deixamos estes contributos e ficamos ao dispor para comentários, dúvidas ou esclarecimentos que esta nossa iniciativa eventualmente suscite.

Cordialmente,

 

Os subscritores do Grupo 7M-Sinodalidade:

– Ana Nunes de Almeida, diocese de Lisboa
– Ângelo Soares, diocese do Porto
– Carlos Pereira da Silva, diocese do Porto
– Edgar Silva, diocese do Funchal
– Fátima Almeida, diocese de Braga
– Joaquim Armindo, diácono, diocese do Porto
– José Carlos Rosmaninho, diocese de Lisboa
– Luís Santos Pereira, diocese de Lisboa
– Luísa Alice Santos Pereira, diocese de Lisboa
– Manuel J. Silva Pinto, diocese de Braga
– Maria Artur Barros, diocese do Porto
– Sara Barbosa Leão, diocese do Porto
– Teresa Martinho Toldy, diocese de Braga.

Um grupo de leitores envia carta aos Bispos Portugueses (PDF)