Sete semanas de Páscoa gloriosa

28 março, 2024  – Voz Portucalense (adaptado)

Por Secretariado Diocesano da Liturgia

            A Cinquentena Pascal é “o tempo forte” do calendário cristão: cinquenta dias que formam uma unidade com a Quaresma e constituem, para os fiéis, os noventa dias mais densos do ano.

            O Ano Litúrgico centra-se nesta Cinquentena festiva, vivida e celebrada como se de um só dia de festa se tratasse: um grande Domingo, na expressão feliz de Santo Atanásio. A Quaresma preparou-a e a Noite pascal inaugurou-a. O Pentecostes não será uma festa separada, mas a plenitude e o cumprimento do que a Noite pascal inaugurou: o Espírito que ressuscitou Jesus de entre os mortos. O tempo pascal, deve, pois, ser vivido como uma unidade (a Solenidade da Ascensão integra-se pois, no mesmo espírito e dinamismo) até à tarde do dia de Pentecostes. A reforma litúrgica suprimiu a oitava de Pentecostes, precisamente porque não é esta a festa que se prepara ou se prolonga, mas antes a Cinquentena pascal que se consuma nesse dia.

            Há, contudo, uma tendência para que a Páscoa quase se fique pela Quaresma. Recordemos que se a Quaresma são quarenta dias, a Páscoa são cinquenta: é mais! Se a Quaresma é a imagem do mundo presente e do tempo que passa, a Páscoa é a antecipação da eternidade, a afirmação do definitivo. O deserto – a Quaresma – é precioso porque conduz à Terra prometida, onde corre leite e mel… E a história, boa mestra, ensina-nos que se a Quaresma é uma instituição do século IV, a Páscoa já resplandece como laetissimum spatium (Tertuliano) na vivência cristã do século II!

            O fundamental emergiu primeiro…

            Nos nossos dias, em que parece tresmalhado o horizonte do eterno, em que a tensão escatológica se esvaziou (apesar de a Liturgia a manter sempre viva, só que se perdeu o assombro que a reconhece, a insufla e dela se alimenta), a pastoral, inadvertidamente, fez da quaresma a versão presente do mito de Sísifo: empurra-se com fadiga uma pesada pedra até ao cimo de íngreme montanha mas, quando parece ter-se alcançado o cume, eis que o pedregulho resvala de novo até ao vale de onde se partiu e a vida se reduz a uma quaresma sem páscoa. Passada a Vigília e o primeiro domingo de Páscoa – que muitos «fiéis» nem chegam a celebrar porque querem é aproveitar mais umas férias loucas da civilização do vazio –, resvala-se de imediato para o quotidiano rasteiro de um tempo «ordinário» (sem qualquer menosprezo pela preciosidade do Tempo Comum). Importa, pois, um esforço pastoral e uma mudança de mentalidade para combater esta desfocagem. Aliás, é centrando a Páscoa na Cinquentena que captaremos o sentido da Quaresma.

            Durante este Tempo, tanto as celebrações litúrgicas, como as possíveis formas de oração familiar ou pessoal serão um convite estimulante a entrarmos decididamente na Páscoa do Senhor: na Sua “Passagem” à Vida Nova. Este colorido terá expressão na vida quotidiana. Quer dizer que somos convidados a dar a tudo o que fazemos e vivemos (relações humanas, trabalho, dor e alegria…) uma tonalidade pascal. O que a Páscoa de Cristo significa de vida, novidade, alegria, liberdade deve passar para o dia a dia de cada cristão e informar o seu comportamento, de modo que ele se torne, no mundo, testemunha da Ressurreição (engrossando, assim, a série ininterrupta das testemunhas que atravessa os tempos).

            Nesta perspetiva, deixamos algumas sugestões:

  1. Círio Pascal deve ocupar um lugar de destaque, no Presbitério, possivelmente perto do ambão. Só depois do Pentecostes será deslocado para o Batistério. Mas que não seja mais uma velinha (insignificante), acantonada em espaço perdido.
  2. Cuide-se da ambientação da igreja: iluminação abundante e flores. Contudo, o bom gosto deve prevalecer sobre a ostentação e a quantidade.
  3. Haja música festiva já antes das celebrações (se possível, ao vivo, de órgão ou instrumentos). Música sacra, bem entendido, nova e do valiosíssimo tesouro da Igreja.
  4. Nas celebrações haja música instrumental e cantomais abundante. Ressoe na Igreja o louvor cósmico e a adoração do universo ao Vencedor da morte! Dê-se relevo ao canto do Presidente. Para além das aclamações da anáfora e da Liturgia da Palavra, cante-se o Prefácio, ao menos nas celebrações principais. Hoje dispomos da ajuda valiosa do novo Missal, eventualmente complementado pelo livro «O canto do celebrante», editado pelo SNL.
  5. Faça-se o rito da aspersão, com mais frequência, em vez do ato penitencial. A sua nova colocação, no novo Missal (entre os ritos iniciais do Ordinário da Missa),facilita e recomenda o seu emprego; aproveite-se para restaurar o antigo uso de água benta à entrada das igrejas e nas casas, como lembrança do Batismo.
  6. Use-se a forma solene de Bênção, nomeadamente aos domingos.
  7. Nas famílias, permaneça o tom pascal, inaugurado pela visita pascal (compasso), mediante o esforço de cada membro em recriar um ambiente de calorosa convivência e alegria, alimentado pela oração comum.