Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07 setembro 2025
26«Se alguém vem ter comigo e não me tem mais amor que ao seu pai, à sua mãe, à sua esposa, aos seus filhos, aos seus irmãos, às suas irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo. 27Quem não tomar a sua cruz para me seguir não pode ser meu discípulo. Lc 14, 26-27
Viver a Palavra
Nas leituras que a liturgia deste domingo nos propõe sobressai a temática do “caminho”: a nossa vida é um caminho, nem sempre linear, nem sempre fácil, que nos leva até à meta final da nossa existência, a vida verdadeira e eterna. O que devemos fazer e que precauções devemos tomar para não nos desviarmos e falharmos o alvo? Quem nos conduzirá e nos apontará a direção certa? in Dehonianos.
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Continuamos no Tempo Comum, continuamos o Ano Litúrgico – Ano C – onde somos acompanhados pelo evangelista Lucas. Tendo em vista a formação bíblica dos fiéis e a importância do conhecimento da Sagrada Escritura como Palavra que ilumina a vida dos batizados, o contexto do início do Ano Litúrgico pode ser uma oportunidade para um encontro ou até vários encontros, sobre o Evangelista deste ano litúrgico.
Como se diz acima, durante todo este ano litúrgico – 2024/2025 -, acompanhamos o evangelista Lucas em grande parte das proclamações do Evangelho. Deste modo, como preparação complementar, poderá ser oportuna uma proposta de formação para todos os fiéis acerca do Evangelho de S. Lucas.
E faremos isso….
Em anexo à Liturgia da Palavra e, também, num separador próprio, da página da paróquia de Vilar de Andorinho, ficará disponível um texto sobre o evangelista Lucas. Poderão melhorar os conhecimentos bíblicos – Novo Testamento e Antigo Testamento – em https://paroquiavilarandorinho.pt/fbiblica/.Proporciona-se a todos os fiéis, um maior conhecimento deste precioso tesouro que é a Sagrada Escritura.
LEITURA I – Sabedoria 9,13-18
Qual o homem que pode conhecer os desígnios de Deus?
Quem pode sondar as intenções do Senhor?
Os pensamentos dos mortais são mesquinhos
e inseguras as nossas reflexões,
porque o corpo corruptível deprime a alma
e a morada terrestre oprime o espírito que pensa.
Mal podemos compreender o que está sobre a terra
e com dificuldade encontramos o que temos ao alcance da mão.
Quem poderá então descobrir o que há nos céus?
Quem poderá conhecer, Senhor, os vossos desígnios,
se Vós não lhe dais a sabedoria
e não lhe enviais o vosso espírito santo?
Deste modo foi corrigido o procedimento dos que estão em terra,
os homens aprenderam as coisas que Vos agradam
e pela sabedoria foram salvos.
CONTEXTO
O “Livro da Sabedoria” é o mais recente de todos os livros do Antigo Testamento. Foi escrito na primeira metade do séc. I a. C., muito provavelmente. O seu autor terá sido um judeu piedoso, de língua grega, nascido e educado na Diáspora (fala-se, em concreto, de Alexandria como o “berço” deste escrito). Ele conhece bem a história e a fé de Israel; mas, por outro lado, também conhece as correntes filosóficas gregas e sabe a atração que elas exercem sobre os seus irmãos na fé. Inquieta-o a tentação da idolatria que ameaça os judeus das comunidades da Diáspora, seduzidos pelo brilho da cultura helénica. Pondo em diálogo a fé tradicional de Israel com a cultura grega o autor deste escrito pretende mostrar a superioridade da sabedoria de Israel – que brota da fé ancestral do seu povo – em relação à sabedoria que inspira a cultura e o estilo de vida gregos.
Exprimindo-se em termos e conceções do mundo helénico, o autor faz o elogio da “sabedoria” israelita, traça o quadro da sorte que espera o justo e o ímpio no mais-além e descreve, com exemplos tirados da história do Êxodo, as sortes diversas que tiveram os pagãos (idólatras) e os hebreus (fiéis a Javé). Aos seus compatriotas judeus, mergulhados no paganismo, na idolatria, na imoralidade, o autor convida a redescobrirem a fé dos pais e os valores judaicos; aos pagãos, convida, por outro lado, a constatar o absurdo da idolatria e a aderir a Javé, o verdadeiro e único Deus… Judeus e pagãos devem estar cientes de que só Javé garante a verdadeira “sabedoria” e a verdadeira felicidade.
O texto que a liturgia do vigésimo terceiro domingo comum nos propõe como primeira leitura integra a segunda parte do livro (cf. Sb 6,1-9,19). Nesses capítulos o autor coloca na boca de um rei (presumivelmente Salomão, embora esse nome nunca seja referido explicitamente) considerações elevadas sobre a sabedoria, a sua importância e o seu papel na vida dos homens. Concretamente, esse rei exorta os outros reis a adquirir a sabedoria, a fim de governarem retamente (cf. Sb 6,1-21); faz o elogio da sabedoria, sublinhando a sua origem, natureza, qualidades e benefícios (cf. Sb 6,22-8,21); pede a Deus que lhe conceda o dom da sabedoria pois, sem a sabedoria que vem de Deus, nenhum homem poderá saber como conduzir-se para ter êxito e construir uma vida com sentido (cf. Sb 9,1-19). in Dehonianos.
INTERPELAÇÕES
- As modernas tecnologias de comunicação revolucionaram a nossa forma de nos relacionarmos uns com os outros. Fizeram com que todos os habitantes da “aldeia global” ficassem em rede e pudessem partilhar ideias, opiniões, perspetivas, teorias, apreciações, observações, críticas positivas e negativas… Tudo isto pode ser profundamente enriquecedor: pode aproximar-nos de pessoas com outras experiências e vivências, ajudar-nos a entender a verdade do outro, tornar-nos mais tolerantes, mostrar-nos o sem sentido dos nossos preconceitos, abrir-nos à partilha e à comunhão, oferecer-nos conhecimentos a que de outro modo não teríamos acesso. Mas, em contrapartida, todo esse ruído de fundo de ideias e opiniões que a cada instante invade a nossa vida, pode confundir-nos e interferir com a nossa capacidade de fazermos escolhas convenientes. Levados pela “onda”, vamos assumindo acriticamente, sem nos darmos conta, a ideologia dominante, os “valores” que os líderes de opinião procuram impor, as visões da maioria… Será que tudo isso que a “vaga” tecnológica traz até à nossa “praia” nos conduz no sentido da vida plena, da realização total, da verdadeira felicidade?
- Aquele “sábio” do séc. I a.C. que ouvimos na primeira leitura deste domingo lembra-nos as limitações que são inerentes à nossa condição de seres humanos: a nossa inteligência limitada, a nossa dificuldade em levantarmos os olhos da terra para vermos as realidades de Deus, a nossa dependência de valores materiais e fúteis, a nossa dificuldade em nos apercebermos daquilo que dá sentido pleno à nossa vida. Ele acredita que a única forma de descobrirmos o caminho que leva à vida verdadeira é deixarmo-nos guiar pela sabedoria de Deus. Ora, só se deixa conduzir pela sabedoria de Deus aquele que abandonou qualquer caminho de orgulho e de autossuficiência, a fim de se entregar completamente nas mãos de Deus, disposto a acolher com total confiança e com inteira obediência as indicações de Deus. Como é que nos situamos face a Deus? Que valor e que lugar têm as indicações de Deus na construção da nossa vida? in Dehonianos.
SALMO RESPONSORIAL – Salmo 89 (90)
Refrão:
Senhor, tendes sido o nosso refúgio
através das gerações.
Vós reduzis o homem ao pó da terra
e dizeis: «Voltai, filhos de Adão».
Mil anos a vossos olhos são como o dia de ontem que passou
e como uma vigília da noite.
Vós os arrebatais como um sonho,
como a erva que de manhã reverdece;
de manhã floresce e viceja,
à tarde ela murcha e seca.
Ensinai-nos a contar os nossos dias,
para chegarmos à sabedoria do coração.
Voltai, Senhor! Até quando…
Tende piedade dos vossos servos.
Saciai-nos desde a manhã com a vossa bondade,
para nos alegrarmos e exultarmos todos os dias.
Desça sobre nós a graça do Senhor nosso Deus.
Confirmai, Senhor, a obra das nossas mãos.
LEITURA II – Filémon 9b-10.12-17
Caríssimo:
Eu, Paulo, prisioneiro por amor de Cristo Jesus,
rogo-te por este meu filho, Onésimo, que eu gerei na prisão.
Mando-o de volta para ti, como se fosse o meu próprio coração.
Quisera conservá-lo junto de mim,
para que me servisse, em teu lugar,
enquanto estou preso por causa do Evangelho.
Mas, sem o teu consentimento, nada quis fazer,
para que a tua boa ação não parecesse forçada,
mas feita de livre vontade.
Talvez ele se tenha afastado de ti durante algum tempo,
a fim de o recuperares para sempre,
não já como escravo, mas muito melhor do que escravo:
como irmão muito querido.
É isto que ele é para mim
e muito mais para ti, não só pela natureza,
mas também aos olhos do Senhor.
Se me consideras teu amigo,
recebe-o como a mim próprio.
CONTEXTO
A Carta a Filémon é a mais breve e pessoal das cartas de Paulo. É endereçada a Filémon, um homem de elevada posição social convertido por Paulo, aparentemente um membro destacado da comunidade cristã da cidade de Colossos, na Ásia Menor.
A partir dos dados da carta, podemos reconstruir as circunstâncias em que o texto aparece. Onésimo, um escravo de Filémon, fugiu de casa do seu senhor. Sem que saibamos pormenores, o fugitivo chegou até Paulo, ligou-se a ele e tornou-se cristão. Paulo, que nessa altura estava na prisão (não sabemos se em Éfeso ou se em Roma), fê-lo seu colaborador e manteve-o junto de si. No entanto, a situação podia tornar-se delicada se Filémon se ofendesse com Paulo; e, do ponto de vista legal, ao dar guarida a um escravo fugitivo, Paulo era cúmplice de uma grave infração ao direito privado. Enfim, Onésimo corria o risco de ser preso, devolvido ao seu senhor e severamente castigado.
Paulo, consciente de tudo isto, resolve enviar Onésimo a Filémon. Onésimo, o escravo que volta para o seu senhor, é portador de uma carta de Paulo em que este explica a Filémon a situação e lhe pede que acolha novamente Onésimo, já não como um escravo, mas como um irmão muito querido. Com delicadeza Paulo insinua mesmo a Filémon que, sendo possível, lhe devolva Onésimo, já que este lhe vem sendo de grande utilidade. Contudo, Paulo não impõe nada: deixa a decisão nas mãos de Filémon.
Esta carta particular é um texto muito belo. Nela podemos ver, ao vivo e a cores, o coração de Paulo. in Dehonianos
INTERPELAÇÕES
- Onésimo é um escravo; pertence aos últimos da sociedade, ao enorme contingente dos que não têm direitos nem voz. Fugiu da casa do seu senhor; quem o acolher pode ser condenado como seu cúmplice. Apesar de tudo isso, Paulo acolhe Onésimo, interessa-se pela sua sorte, anuncia-lhe a Boa Notícia de Jesus, fá-lo nascer para a fé, trata-o como “o filho” que gerou na prisão. Paulo consegue ver naquele escravo sem direitos civis um ser humano revestido de dignidade. São muitos os “onésimos” que todos os dias se cruzam connosco. Talvez tenham o rosto de um sem abrigo, ou de um imigrante sem papéis, ou de um idoso sem família, ou de um doente em fase terminal, ou de um ex-recluso que tenta integrar-se novamente na sociedade, ou de um “agarrado” pela droga ou pelo álcool… Conseguimos “ver” a dignidade desses irmãos e dessas irmãs que jazem na berma dos caminhos que percorremos? O que fazemos por eles? Tratamo-los como irmãos?
- Paulo pede a Filémon que acolha Onésimo não como escravo, mas “como irmão muito querido”. O projeto de Deus para o mundo e para os homens não previa senhores e escravos; previa a igualdade fundamental de todos, previa uma comunidade de “irmãos” com direitos iguais e igual dignidade. Nós conhecemos o projeto de Deus; mas ainda não o levamos a sério. Continuamos a construir o nosso bem-estar a partir de práticas e estruturas que geram escravidão e sofrimento. No nosso “civilizado” séc. XXI, temos redes organizadas de tráfico de pessoas; exploram-se imigrantes clandestinos, obrigando-os a trabalhar por salários miseráveis e dando-lhes condições de alojamento infra-humanas; comerciamos e consumimos sem problemas de consciência produtos que resultam do trabalho escravo; aceitamos como uma inevitabilidade que muitos trabalhadores humildes sejam tratados com arrogância e prepotência pelos seus “patrões”; distinguimos, quanto à remuneração, o trabalho dos homens e das mulheres… Como vemos tudo isto? Qual a nossa responsabilidade em tudo isto? Como tratamos aqueles que estão sob a nossa dependência, incluindo as pessoas da nossa família: são, para nós, “iguais”, ou os nossos “escravos”?
- Paulo põe o amor no centro de toda a experiência cristã. Ele acredita, na linha de Jesus, que o amor é o valor fundamental na construção de um mundo renovado. A injustiça, a exploração dos seres humanos, a escravatura, a guerra, não desaparecerão através do recurso a métodos violentos. Os métodos violentos só servirão para substituir uns senhores por outros senhores, uns escravos por outros escravos, uns sofredores por outros sofredores. A construção de um mundo mais feliz e fraterno só acontecerá com a conversão dos corações ao amor. Quando essa conversão se der e nascer a civilização do amor, teremos finalmente um mundo mais humano, mais justo, mais pacífico. É esta também a nossa convicção? Estamos disponíveis para nos convertermos ao amor e sermos arautos – com palavras e gestos – de um mundo mais fraterno? in Dehonianos
EVANGELHO – Lucas 14,25-33
Naquele tempo,
seguia Jesus uma grande multidão.
Jesus voltou-Se e disse-lhes:
«Se alguém vem ter comigo,
sem Me preferir ao pai, à mãe,
à esposa, aos filhos, aos irmãos, às irmãs
e até à própria vida,
não pode ser meu discípulo.
Quem não toma a sua cruz para Me seguir,
não pode ser meu discípulo.
Quem de entre vós, que, desejando construir uma torre,
Não se senta primeiro a calcular a despesa,
para ver se tem com que terminá-la?
Não suceda que, depois de assentar os alicerces,
se mostre incapaz de a concluir
e todos os que olharem comecem a fazer troça, dizendo:
‘Esse homem começou a edificar,
mas não foi capaz de concluir’.
E qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei
e não se senta primeiro a considerar
se é capaz de se opor, com dez mil soldados,
àquele que vem contra com ele com vinte mil?
Aliás, enquanto o outro ainda está longe,
manda-lhe uma delegação a pedir as condições de paz.
Assim, quem de entre vós não renunciar a todos os seus bens,
não pode ser meu discípulo».
CONTEXTO
Jesus está a percorrer a caminho que leva da Galileia a Jerusalém, rodeado pelos seus discípulos. Prepara-se para encontrar os líderes judaicos da capital e para os confrontar com a proposta do Reino de Deus. Ao longo do caminho, muitas pessoas vêm ter com Ele e demoram-se a escutá-l’O. Algumas, entusiasmadas com a sua pregação sobre o Reino de Deus e com os seus gestos poderosos, querem segui-l’O, propõem-se integrar o Seu grupo de discípulos.
Jesus quer assegurar que esses candidatos a discípulos sabem no que se vão meter. Ele não está interessado em gente que adere por um impulso momentâneo de entusiasmo, mas que depois não tem a força e a persistência necessárias para levar até ao fim o desafio do Reino de Deus. Para evitar mal-entendidos, Jesus indica um conjunto de condições que são necessárias para O seguir. São condições bastante duras, plenas de radicalidade, pois o caminho do Reino é um caminho bem difícil. Jesus em nenhum momento “vende” otimismos fáceis ou suaviza as suas exigências. Ele não está preocupado com o número dos que O seguem; mas quer que todos os que decidem ir atrás d’Ele tenham, desde o início, as coisas bem claras. Há quem chame a este texto o “discurso sobre o discipulado”. A maioria dos “ditos” que entram na sua composição são exclusivos de Lucas. in Dehonianos.
INTERPELAÇÕES
- Talvez o mais impressionante neste texto seja a absoluta primazia que, na perspetiva de Jesus, o Reino deve assumir na vida dos discípulos. Ser discípulo de Jesus é ir atrás d’Ele no caminho do Reino, sem desculpas, sem cedências, sem condicionantes, sem transigências, sem meias tintas, sem “paninhos quentes”, sem acomodações fáceis. O Reino de Deus deve ser, para os discípulos de Jesus, a prioridade máxima, a pérola mais preciosa, o “tesouro escondido” pelo qual vale a pena deixar tudo o resto. É possível que esta radicalidade nos faça hesitar. Nós não estamos habituados a tal exigência, nem gostamos que nos coloquem sobre os ombros tanta pressão. Gostamos de caminhos que não exijam muito de nós, de soluções de compromisso, de propostas que não ponham em causa o nosso bem-estar, de indicações que não nos tirem da nossa zona de conforto, de direções que não nos obriguem a passar pela cruz. Como nos situamos face a tudo isto? Estamos, apesar de tudo, decididos a apostar em Jesus e na sua proposta? Sentimo-nos discípulos que caminham incondicionalmente atrás de Jesus? Que lugar ocupa o Reino de Deus e a sua justiça na nossa lista de prioridades?
- Tudo isto nos faz pensar na forma como, no dia a dia, os cristãos vivem a sua fé e como, nas nossas comunidades cristãs, se faz pastoral. Talvez o nosso exercício pastoral esteja, muitas vezes, mais direcionado para congregar grandes massas, do que para fazer discípulos de Jesus. Entusiasmamo-nos com acontecimentos religiosos que reúnem grandes multidões; ficamos orgulhosos quando podemos apresentar números elevados de batismos, de comunhões, de casamentos, de crismas, de confissões; sentimo-nos felizes com o número de pessoas que enchem as ruas das nossas cidades quando organizamos solenes procissões… Tudo isso tem, sem dúvida, o seu lugar nas nossas concretizações pastorais; mas a nossa preocupação primordial não deveria ser ajudar as pessoas a encontrar-se com Jesus, a conhecê-l’O, a segui-l’O, a colaborar com Ele na construção do Reino de Deus? Quando alguém se apresenta num dos nossos cartórios paroquiais para “marcar” um batizado ou um casamento, temos o cuidado de a ajudar a perceber que a receção do sacramento só faz sentido se ela está disposta a comprometer-se no seguimento de Jesus?
- Dentro do quadro de exigências que Jesus apresenta àqueles que querem percorrer o caminho do discipulado, sobressai a exigência de O preferir à própria família (“se alguém vem ter comigo, sem Me preferir ao pai, à mãe, à esposa, aos filhos, aos irmãos, às irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo”). Não é de ânimo leve que ouvimos isto. Sentimos até que Jesus, ao pedir-nos tal coisa, está a pedir demais, está a esticar demasiado a corda. O amor que sentimos pelas pessoas que nos são mais queridas parece-nos algo do qual não podemos nem devemos prescindir. Na verdade, Jesus não está a exigir que, sem mais, cortemos os laços com aqueles que amamos; está, com a linguagem peculiar dos pregadores da época, a dizer-nos que os laços afetivos, por mais sagrados que sejam, não devem afastar-nos dos valores do Reino de Deus. Pode acontecer que, em algum caso, alguém a quem estamos ligados por laços de família ou de amizade pretenda afastar-nos dos valores do Reino de Deus; nesse caso, segundo Jesus, devemos dar a primazia ao Reino de Deus. Já nos aconteceu, em alguma circunstância, termos de optar entre os valores de Jesus e as exigências de pessoas a quem estamos ligados por laços de afeto? Qual foi a nossa escolha?
- Outra exigência que Jesus faz aos candidatos a discípulos é a renúncia a si próprio e o tomar a cruz do amor, do serviço, do dom da vida (“quem não toma a sua cruz para Me seguir, não pode ser meu discípulo”). Trata-se de uma exigência que toca o âmago do nosso ser e que muda radicalmente o ângulo a partir do qual nós entendemos e construímos a nossa existência. “Tomar a cruz” é viver como Jesus. Ora, “viver como Jesus” é renunciar a construir a vida com chave de egoísmo, de autossuficiência, de ambição, de preocupação exclusiva com o próprio interesse pessoal; “viver como Jesus” é entregar a própria vida nas mãos de Deus, obedecer-Lhe, dar prioridade absoluta à concretização do projeto que Ele tem para o mundo e para cada homem; “viver como Jesus” é fazer da própria vida um dom de amor e amar, servir, cuidar dos irmãos que a cada instante se cruzam connosco nos caminhos da vida, especialmente os mais frágeis, os mais pequenos, os mais abandonados. Talvez o “viver como Jesus” não seja, para muitos dos nossos contemporâneos, um sentido de vida muito popular; mas é ainda hoje, como o foi sempre, o único caminho que os discípulos de Jesus devem percorrer. É nesta direção que temos andado a caminhar?
- Uma terceira exigência de Jesus pede aos candidatos a discípulos a renúncia aos bens (“quem de entre vós não renunciar a todos os seus bens, não pode ser meu discípulo”). Mas Jesus não sabe que necessitamos dos bens para viver? Ele não quer que vivamos dignamente, sem cairmos numa miséria que nos rouba a dignidade? Jesus sabe que necessitamos dos bens materiais para termos uma vida digna; mas também sabe que, com facilidade, nos apegamos aos bens materiais e nos tornarmos escravos deles. Quando isso acontece, perdemos o controle da nossa vida. Os bens materiais tornam-se o nosso “deus”. Esquecemo-nos de que os bens que Deus colocou à nossa disposição se destinam a todos os nossos irmãos; tornamo-nos indiferentes à sorte dos pobres; interessamo-nos apenas em juntar mais e mais, numa história de ambição e de avareza que nos isola, nos embrutece e nos desumaniza. A obsessão com os bens materiais subverte completamente a lógica do Reino de Deus, que é uma lógica de partilha, de dom, de fraternidade. Por isso, o apego aos bens materiais nunca poderá ser um elemento constitutivo do caminho do discípulo. Que lugar é que os bens materiais desempenham na nossa vida?
- Segundo parece, Jesus nunca se preocupou em ter um grande número de seguidores. O que Ele queria é que os seus discípulos – muitos ou poucos – interiorizassem os valores do Reino e que os vivessem de forma coerente e comprometida. Para Jesus, não valia tudo; o caminho do discipulado não é um caminho de facilidade. Por isso, Ele até pedia aos candidatos a discípulos que pensassem bem se se sentiam com forças para embarcar na aventura do Reino de Deus. Entretanto, passaram-se dois mil anos; o mundo mudou e nós temos uma outra compreensão das coisas. Não será altura de afrouxarmos algumas das exigências de Jesus para facilitarmos o envolvimento de mais pessoas no caminho da fé? A verdade é que as exigências de Jesus continuam válidas. Suavizá-las, atenuá-las, apresentá-las numa versão “light” poderá significar trairmos o Evangelho de Jesus. Aliás, nem sequer é certo que o afrouxamento das exigências se traduza numa maior adesão ao Evangelho: o que tantas vezes desanima as pessoas e as afasta da comunidade do Reino, não é a exigência, mas é o comodismo, a vulgaridade, o pouco compromisso, a falta de seriedade que veem na Igreja de Jesus. Como vemos isto e como nos situamos face a isto? in Dehonianos.
Para os leitores:
I Leitura: (ver anexo)
II Leitura: (ver anexo)
ANEXOS:
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- Leitura I do Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07.09.2025 (Sabedoria 9, 13-19 (gr. 13-18b)
- Leitura II do Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07.09.2025 (Filémon 9b-10.12-17)
- Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07.09.2025 – Lecionário
- Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07.09.2025 – Oração Universal
- Domingo XXIII do Tempo Comum – Ano C – 07.09.2025 – refletindo
- A Mesa da Palavra TC Domingo XXIII
- ANO C – Ano de Lucas- 2024-2025